quinta-feira, 7 de junho de 2012

7- França, 1940


Corri rua abaixo com o papel na mão. O que quer que tenha levado Kristen Smain podia estar ali, me observando nesse exato momento, como um animal pronto para dar o bote. Um arrepio percorreu minha nuca, e olhei instintivamente para os lados, enquanto tropeçava rua abaixo.
Kris estava em perigo por minha culpa. A culpa era minha, todos estavam em perigo por minha culpa. Eu poderia ir embora, me render aos Arcanjos ou simplesmente voltar para a casa e esperar...esperar pelo quê? Minha vida nunca mais seria a mesma depois desses dois dias. Eu havia enfim descoberto o que eu era de verdade, e por mais que eu não aceitasse isso com muito carinho, era o que eu queria, a verdade. Meu pai...Um Arcanjo, o maior deles...Miguel...Ah, meu pai! Pelo amor de Deus, como minha vida foi chegar a esse ponto? A ponto de eu ir para França com um três anjos quase desconhecidos mas que estavam se tornando meus amigos, para uma missão suicida? Como eu, Catherine Lohan, poderia ter achado que salvaria um Arcanjo do inferno e impediria um anjo caído a não se erguer e fazer do mundo, apocalíptico?  
Meus pensamentos fluíam a ponto de manchas escuras cobrirem minha visão. Rendaria-me tão fácil assim ou lutaria? Lutar. Eu iria lutar. Independente com quem ou com o quê.
Tropecei e cai de joelhos, um vento forte soprava meus cabelos curtos ainda mais para o rosto. Levantei-me, tirei os óculos e os coloquei na bolsa, enquanto corria. Estava quase chegando. Quase. Alguns quilômetros e chegaria. O vento cessou de repente e parei. Sem saber o por que, eu parei. Olhei sobre o ombro e um homem de observava, a mais ou menos 4 metros da onde eu estava. Tentei vê-lo melhor, mas uma névoa negra o cobria, um arrepio subiu pela minha barriga e o meu subconsciente me avisou que aquele homem, seja quem fosse, não estava ali para me ajudar. Mas se fosse quem seqüestrou Kristen? Pensei. Não poderia deixá-lo ir ileso.
Ele se aproximava. Três metros, dois. O homem tinha mais ou menos 30 anos, era negro e tinha os cabelos encaracolados e estava todo de preto. Sua expressão era de calma, mas ao mesmo tempo impaciente. Ele se movia em uma velocidade surpreendentemente rápida e sobre-humana.
Não. Ele não estava aqui para ajudar.
Corri, dessa vez mais rápida. Corri e não olhei para trás para saber se ele me seguia, já podia ver a garagem no fim da rua. Mas e se eu o levasse para Eduardo e Dan? Daria tempo de dar a partida no ônibus?
– Você não pode fugir de mim. – Disse uma voz áspera e calma, muito, muito perto de mim. Corri ainda mais rápido, murmurando “vai se foder”, e acho que ele ouviu, pois começou a rir, uma risada irônica e maléfica. Estava a menos de um metro de mim. Corri mais rápido, a garagem estava muito perto e já podia ver Eduardo de costas para a rua, mexendo em alguma coisa no portão da garagem. Dan não estava ali.
– Eduardo! EDUARDO, OLHA PRA MIM. EDUARDO! – ele se virou e o alivio tomou conta de mim, ele franziu o cenho e me vi correndo ainda mais rápido que o normal.
Em poucos segundos estava ao lado dele arfando, olhei para trás e não havia homem nenhum. Ninguém me seguia. A rua estava vazia.
– Tinha um homem me seguindo – coloquei minhas mãos sobre a perna, ainda arfando. Meu coração disparava descontroladamente. – Kristen sumiu, Eduardo! Meu Deus, tinha alguém me seguindo...e sumiu...sumiu...
– Cathy – Eduardo me abraçou, tentando me acalmar. Não sabia quando tinha começado a chorar, mas lágrimas escorriam sobre meu rosto, não fiz nada para impedi-las. O medo me invadia. – Cathy...
A voz de Eduardo sussurrando meu nome no meu ouvido, o seu cheiro na camisa pólo em que eu encharcava de lágrimas, seus braços me cercando e me protegendo...aquilo era tentador.
– O que aconteceu? – ouvi a voz de Dan de algum lugar.
– Kristen sumiu, tinha alguém... – mas Eduardo não conseguiu terminar, Dan já grunhia e xingava em latim.
– KRISTEN SUMIU? O QUÊ? COMO PODE DEIXÁ-LA SUMIR, CATHY?
Comecei a chorar ainda mais forte, tremendo nos braços de Eduardo.
– Por favor Dan, não a culpe. Ela ainda é nova... e deixe-a explicar.
Eduardo levantou meu rosto para que pudesse olhar nos meus olhos. Perdi-me naqueles olhos negros...parecia um abismo sem fim, tanto afeto, preocupação e carinho. Eu não merecia aquilo. Eu havia deixado Kristen desaparecer. Minha culpa. Porque eu ainda era “nova demais”.
Larguei-me de seu abraço e soluçando, comecei a falar, para Dan.
– A gente estava no começo dessa rua e...e andávamos... – respirei fundo, tentando formular palavras mais complexas. – Mas do nada Kris sumiu. Ela tagarelava sem parar e de repente me olhou como se disse “o que você fez?” e sumiu. Sumiu! – Comecei a chorar de novo e me sentei na calçada, e recomecei, entre soluços. – E vim correndo pra cá, pedir ajuda...mas ai um homem começou a me seguir...ele estava todo de preto e coberto por uma névoa negra...Aimeudeus! e ele disse que eu não podia fugir dele...ele era rápido...mas quando cheguei aqui ele sumiu! Sumiu! Também! Mas...quando Kris sumiu, um papel apareceu onde ela estava.
Abri as mãos e entreguei a Dan o papel amassado, ele soltou um palavrão e se virou para Eduardo, com raiva.
– Temos que ir até lá! É Kristen!
A calma de Eduardo estava me estressando, como podia ficar calmo quando Kristen estava desaparecida?
– Vamos mas...isso me lembra algo, Dan.
– Hã? – perguntei.
– A visão. Quando você e Kristen estavam fora, Dan teve uma visão...uma profecia, pra falar a verdade.
Daniel pareceu ter batido em uma parede de vidro, ele começou a andar em círculos, pensando.
– É claro! A primeira frase da profecia...
– Do que estão falando? – Levantei-me da calçada, cambaleando. Uma profecia? Tipo do futuro?
– Na profecia dizia – e Eduardo começou a citar, nervoso:


Filha do Pecado, a Morte a ti espera;
Terá aquilo que necessita, mas do que adiantará?
Estará cercada pelas trevas.

Do Anjo, as portas da vida se abrirão.
Mas a morte reina;
Destrói;
Desperta.
O amor lhe sufocará.
Oh, deusa! Coração destruído,
Amor proibido.”


Um silêncio sombrio nos cercou, podia se ouvir meu coração batendo, ainda descontrolado.
– Então é isso? – perguntei por fim, quebrando o silencio. – Eu sou a deusa do coração destruído? QUE NÃO VAI CONSEGUIR PORRA NENHUMA? É ISSO?
Meus gritos ecoaram pela rua, lágrimas quentes desciam cada vez mais rápidas pelo meu rosto. Eu era um fracasso total. Uma idiota que acabara de perder uma amiga e que tinha o futuro marcado para a destruição.
– Não pense assim, Cathy. – Eduardo se virou pra mim, sua máscara de calma caindo enfim, mas mostrando algo insuportável. Dor. A dor era tudo que se via em seus olhos, em seu rosto...na linha fina de sua boca. Dor. Era como se ele estivesse cercado por ela. – Não pense isso. Por favor.
Quis correr para abraçá-lo, não suportava ver aquilo: a dor em todo o seu rosto.
– Temos que salvar Kris – disse Dan, ele parecia estar longe dali. Em outra dimensão.
– Salvá-la do que? – olhei para ele, enxugando os olhos. Algumas lágrimas pretas ainda escorriam...delineador.
A Morte a ti espera. Talvez....talvez ela seja uma isca. De qualquer jeito, temos que ir até lá. – Ele pegou a minha mão e a de Eduardo e antes que pudéssemos protestar, viajamos nas sombras, na escuridão infinita.
Aparecemos em uma estrada de terra...algumas pessoas faziam caminhada por ali, e ninguém pareceu nos notar. A nossa frente à Torre Eiffel emergia assustadoramente grande. Nunca tinha ido a França e só tinha visto a Torre Eiffel por fotos, nunca imaginei que podia ser tão grande e ao mesmo tempo tão linda.
Árvores nos cercavam por todos os lados. A nossa esquerda havia um lago, azul como a cor do céu e cercado pelas sombras das árvores. O caminho a nossa frente estava vazio, o que era estranho.
Então quinze homens de branco apareceram a nossa frente, com armaduras gregas e antigas. Nosso instinto foi igual, viramos para correr para o outro lado, mas uns trinta homens igualmente de brancos e armados pairavam lá. Pensei em me jogar no lago, mas talvez estivesse frio demais. O fato principal era: estávamos cercados e não tínhamos condições para lutar.
Estão vigiadas todas as estradas...todos os meios de viagem...não poderemos viajar nas sombras, a voz de Dan ecoou na minha cabeça. Agora sabíamos o que aconteceria se um anjo viajasse nas sombras com Cathy Lohan!
– Fujam! – gritou Dan. Mas no mesmo momento em que ele disse isso, todos levantaram suas espadas e deram um grito de guerra.
Eles vão nos atrasar, pensei. Vai ser tarde demais se continuarem aqui.
E então foi tudo muito rápido. Em um momento todos nós estávamos gritando e no outro os Homens de Branco haviam virado pó. No seu lugar, roupas brancas, espadas e armaduras caíram no chão.
– Oh! – exclamou Eduardo. E ele e Dan se viraram pra mim, espantados.
– Você fez isso? – espantou-se Dan.
– Não. Não! Eu...eu não...não podia...eu só queria que eles não estivessem aqui...porque...porque...aimeudeus, não me diga que eu os destruí!
– Oh! Oh! Oh! – repetiu Dan, seus olhos perplexos. – Você destruiu uns...40 anjos com um pensamento! Sai de perto de mim, Cathy! – brincou, e começou a rir, satisfeito, mas pude ver a tristeza no riso.
– Está...triste? – perguntei.
– Não é...são meus irmãos, Cathy. Eles só estavam fazendo seu serviço e – ele já não ria mais, olhou para a Torre Eiffel e suspirou – Mas é por Kristen...eles iam nos matar de qualquer maneira. Eram as nossas vidas ou as deles.
– Eu... – mas não consegui dizer mais nada. Naquele momento uma escuridão me envolveu e parecia que tinha milhões de toneladas em cima de mim, me espremendo e me tirando o ar.
E então parou. Eu estava de volta ao mesmo lugar, mas em cima de Eduardo. Estávamos deitados no chão, ou ele no chão e eu em cima dele? Não importa. Nossos rostos estavam tão pertos um do outro que podia sentir seu hálito de menta tocando meu rosto, seus olhos estavam arregalados e eu sentia que os meus também. E foi ai que fui jogada na grama com tanta força que poderia ter me feito em pedacinhos, mas não fez, nem doeu. Mas foi desconfortável. Eduardo estava em pé onde segundos antes estava deitado, ele respirava com dificuldade e encarava-me como se eu o tivesse esmurrado em publico. E me dei conta de que ele havia me jogado na grama. Levantei sobrenaturalmente rápido e comecei a gritar com ele.
–  O que eu fiz? VOCÊ PODERIA TER ME MACHUCADO! SEU LOUCO, MALUCO, PSCICOPÁTA!
– Eu...ahh Cathy, me perdoe. Eu perdi a cabeça e... – ele tentou se aproximar de mim mas me esquivei, e foi ai que notei que tinha centenas de soldados armados a nossa volta. Não exatamente a nossa volta, mas cercando toda a Torre Eiffel. E havia menos árvores e muita gente ao longe, gente demais...soldados vestidos esquisitamente demais...Olhei para Eduardo e olhei para todos os soldados, e olhei para Eduardo. Que merda era aquela?
– O que...
Mas Eduardo já agarrará meu braço e já corríamos em torno da Torre Eiffel, tão rápido que me senti o flash indo salvar o mundo. Duas batidas do meu coração haviam se passado e já estávamos na Quain Branly. Onde centenas de soldados armados marchavam.
– Isso parece um cenário da... – mas não podia acreditar no que via, não podia. Era impossível.  E onde estava Dan? Senti-me culpada por tê-lo deixado lá no meio dos soldados, e se fizessem alguma coisa com ele? Mas ninguém parecia nos notar. Como se fossemos invisíveis...
– Segunda Guerra Mundial? – Eduardo completou. Ele segurava minha mão e olhava ao redor. Realmente, não parecia que estávamos em 2011. Parecia mais...
– Não!
– Sim.
– O que eu fiz...
– Acho que dessa vez não foi você.
– Mas Eduardo...se não me falha a memória esses soldados são nazistas e estamos em...
– 1940.
– Exatamente – uma voz cansada soou atrás de nós, nos viramos na mesma hora e deparamos com um velhinho: muito pálido e de cabelos muito brancos. Ele andava com dificuldade mas com determinação. Usava um terno preto e um chapéu marrom, óculos quadrados e finos. Sua pele era tão enrugada que parecia que ia se rasgar, ali mesmo. – Você deve ser Catherine Lohan, filha de Miguel. E você...quem é você? – ele olhava intrigado para Eduardo, que parecia desconfortável a presença do velho. Mas Eduardo não se apresentou, em vez disso fez a pergunta que também me matava de curiosidade.
– Quem é você?
– Eu? Eu sou a Morte.
– Mentira. – Acusei, sem pensar.
– E por que eu mentiria, Catherine? Você foi avisada, não foi? A profecia...
– Ahhh! – exclamou Eduardo. – A Morte a ti espera.
– Isso. – E a Morte se virou para os soldados que marchavam em igualdade. A dor era evidente no rosto da Morte. Aquilo me assustou mais do que eu pensei. – Precisamos conversar – ele disse. – Sobre sua vida Cathy.

Cathy Lohan e os Espíritos da Morte.
Por: Carol C.

6 comentários:

  1. Fico cada vez mais fascinada por essa história, aaah *---*

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  2. Carol, arrasando como sempre!!
    Amei amei e amei.
    Quero só ver o proximo eim!!
    Posta rapido por favor *--*
    Bjs

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  3. Sério man, parabéns.

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  4. Ela é uma nefilim ou um anjo?

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    1. Nefilim é um raça criada de um anjo caído e um humano, e Cathy não é filha de um anjo caído...por isso as pessoas não sabem que nome (raça) dar a ela...nem eu '.' rs =D ela não é um anjo.

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  5. Uau! Cada capitulo me fascino mais e mais por essa historia.

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